Onde comprar livros nos interiores do Brasil?


 

Nos últimos anos tive a oportunidade de bater perna por várias regiões do Brasil para conversar sobre literatura, livros, leitura e tudo que embala este universo das letras. Muitas e muitas coisas aconteceram, e dentro dessas experiências, um refletir que ainda venho em busca da compreensão: livrarias nas pequenas cidades do interior deste Brasil.

“Mailson, mas tua cidade não tem livraria?”, “Como ‘cê compra seus livros?”, “Como ‘cê vende seus livros?”. Foram algumas das tantas perguntas que ainda surgem, como algo surpreendente a quem caminha neste campo da literatura e não dispõe deste acesso (pelo menos da forma mais convencional possível). Por tanta surpresa terceira, comecei a pensar mais sobre tal questão, o tal mercado editorial de onde vivo no imenso sertão nordestino.

O Ceará possui 184 munícipios, destes, pouco mais de 10 possuem livrarias especializadas (aquelas que se dedicam exclusivamente à venda de livros ou têm estes como principal produto de comercialização). Distribuídas praticamente apenas em 3 regiões do estado: Fortaleza e algumas cidades da região metropolitana; Sobral na zona norte do Estado; e Crato e Juazeiro do Norte, no Cariri. Tal situação não é muito diferente em Pernambuco, Piauí, Paraíba, Rio Grande do Norte… Como então o livro chega cá nesses rincões do Brasil?

De forma sistemática, nos interiores do Nordeste, a chegada do livro ou da literatura aconteceu inicialmente com os folhetos de cordel a passearem em matulões pelas feiras – único evento presente em toda e qualquer localidade em meados do século XIX. Obviamente, já havia circulação de edições um tanto mais trabalhadas, inclusive publicadas no próprio Nordeste, mas totalmente restrita à classe dominante, a única letrada na época. Tal panorama mantém-se até meados da metade do século XX, onde acontece um primeiro esboço da institucionalização do ensino no país, que trouxe consequentemente o livro ao encontro de tantos ainda sem oportunidades, e onde apareceram os primeiros espaços para leitura: as primeiras bibliotecas, geralmente dentro de escolas.

Dentro dessas bibliotecas, que com o passar das décadas foram se fortalecendo (e onde inclusive eu descobri a literatura), que o encontro com livros se deu para tantos, e afirmo que ainda hoje nas pequenas cidades, sejam elas os principais espaços de acesso e circulação do livro, institucionalizados ou independentes.

Mas e as livrarias?

Nesse trilhar histórico, infelizmente nos interiores do Nordeste (e creio que em grande parte do país também) a livraria ainda é um espaço restrito geralmente a capitais ou cidades maiores em população ou economia, com raras e felizes exceções.

Onde então comprar livros? Ainda nas feiras?

Não.

Com o início da massificação da internet na metade da última década, esta se tornou a “livraria” dessas pequenas localidades. O inesgotável acervo, facilidades de compra, vezes com preços muito menores que nas próprias livrarias acabam por atrair, e corroborar, por um prisma puramente econômico, para que esta simples ferramenta de entretenimento substitua o escasso espaço físico. Quando não. Quando nunca. Comprar livros não se encerra no simples comprar. Não é como comprar sapatos ou tijolos. Comprar livros é uma experiência cultural, e a livraria pra além de um espaço de compra-e-venda é mais ainda um espaço de convivência. Um lugar para se estar, não para passar apenas.

Muita coisa há de se debater e se entender sobre um quadro tão doloroso para um país-continente como o Brasil. Políticas de incentivo fiscal à criação de espaços de livros; debates mais aprofundados entre autores, editoras, distribuidores e consumidores são algumas das primeiras possibilidades para a mudança, e de fato a chegada das livrarias a todos os rincões desse país.

 

Texto publicado inicialmente do Portal Ver Agora, em novembro de 2020.

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